quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Catalepsia - 01

O dia não amanheceu pra mim. Não se iniciou. Apenas terminou, escureceu, desbotou. Uma vez para nunca mais. Mas nunca mais? Nunca mais como, se ainda sinto a vida a percorrer-me o corpo? Se for a vida que, de fato, me percorre... Mas fato é: eu a percorri, a vida. Percorri tão fugaz, tão medroso, tão rapidamente. Mas não me arrependo, somente porque estou gostando desse meu estado Brás Cubas em que estou, esse entremorte, se assim pode-se dizer.

Foi tão de repente. Até sem graça. De tão percorrida a vida, a morte seguiu a sua velocidade. Deu-se abrupta, súbita, sem direito a despedidas. Não que eu queira me despedir de alguém... Eu não possuía muitos a me sentir... Mas também não me arrependo. Se dizem que da vida não levamos nada, acrescento: não levamos nada, nem ninguém - a não ser em circunstâncias bem específicas, como uma chacina, ou segurar alguém ao cair no abismo (ok, é brincadeira). Pode parecer meio individualista, eu sei, mas sou assim. As companhias de nada adiantavam-me a não ser para o tédio - para causar-me o tédio - ou bloquear-me as ideias. Ah, sim, eu escrevo. Sou escritor. Ou tento ser. Se arte é subjetiva, para mim, chega a ser abstrata.

Mas, retornando à essência do meu relato, o sol apenas se pos para mim naquele dia. Por uma questão de justiça, admito: a lua, para mim, nasceu, mas - assim como as pessoas - não adiantou-me em nada. Se ainda fosse o sol...! Presenteando-me com mais um dia, um nascente, uma manhã de nuances âmbar por detrás das nuvens. Mas não. Tive o desprazer de um luar e um poente. Na verdade, nunca gostei de poentes. A ideia de esmorecência da vida me desagrada, apesar da minha vida ser uma... Não-vida.

É isso aí. Eu não vivi, eu não-vivi, isso sim. E chega a ser triste só perceber a não-vida na morte (ou seria talvez-morte?), sem possibilidade de recuperação ou mudança. Não que eu acredite, de fato, na minha própria mudança. Isso seria quase utópico. Acredito na mudança sim, na redescoberta, mas apenas não tenho a força para isso. Não que agora faça diferença... Pó não faz mudanças. Cinzas não mudam. E por mais poético que possa parecer, eu não sou uma fênix, então nada renascerá das cinzas, já espalhadas pelo vento. E, pensando bem, eu sou cinzas? O que aconteceu ao meu corpo? Eu que não o sinto, vejo ou percebo, não sei. Virou nitrato? Comida? Adubo? Eu acho que não faz diferença - aliás, o que faz?

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